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Umbilical

À minha Mãe Deusolina Salles Farias

Escute a poesia recitada por Adaury Farias

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Umbilical

Lá se vão tantos anos e lembranças do tempo
de eu criança, ainda me enchem de alegria.
Na mesa da sala, aquela mão macia,
apoiando a minha que, sem coordenação motora,
cobria de qualquer jeito as letras pontilhadas
do caderno de caligrafia.
Ainda ouço aquela voz suave me fazendo repetir,
uma a uma, as cinco palavrinhas mágicas,
tão simples e perfeitamente adequadas,
que desde lá repito de maneira automática.
Como esqueceria aquele sorriso largo e o olhar
reluzente de imenso entusiasmo, que se abriu,
ao me ouvir, pela primeira vez, soletrar sozinho,
o nome completo de uma loja da rua?
Mas também não esqueço o singelo olhar a me corrigir
quando deslizava entre as frases.
Um dia, inda menino, quando dei fé,
me fiz de adulto e parei de chorar
ao perceber que a dor maior era nela
e não no machucado do meu pé.
E a partir de então vi que nunca estive sozinho
na alegria ou na dor.
Parecia que o cordão umbilical ainda estava ali,
pois tudo nela se refletia.
O tempo dispara e nos separa pelo tom das frontes:
uma castanha, outra encanecida.
No percurso da vida, paixões e amores se instalam
e aos poucos desabam como terras caídas.
Nesse tempo turvo, egoísta que sou, o que me marca
é não tê-la aqui pra aliviar a minha dor.
Só o amor dela tinha o poder de nunca acabar,
um amor eterno, fiel e incondicional.

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